Leonardo Boff
* - 07/07/2013
Contra as tramóias da direita: sustentar a Dilma Roussef
É notório
que a direita brasileira especialmente aquela articulação de forças que sempre
ocupou o poder de Estado e o tratou como propriedade privada (patrimonialismo),
apoiada pela mídia privada e familiar, estão se aproveitando das manifestações
massivas nas ruas para manipular esta energia a seu favor. A estratégia e fazer
sangrar mais e mais a Presidenta Dilma e desmoralizar o PT e assim criar uma
atmosfera que lhe permite voltar ao lugar que por via democrática perderam.
Se por um
lado não podemos nos privar de críticas ao governo do PT (e voltaremos ao
tema), mas críticas construtivas, por outro, não podemos ingenuamente permitir
que as transformações politico-sociais alcançadas nos últimos 10 anos sejam
desmoralizadas e, se puderem, desmontadas por parte das elites conservadoras.
Estas visam a ganhar o imaginário dos manifestantes para a sua causa que é
inimiga de uma democracia participativa de cariz popular.
Seria grande
irresponsabilidade e vergonhosa traição de nossa parte, entregar à velha e
apodrecida classe política aquilo que por dezenas de anos temos construido, com tantas oposições: um
novo sujeito histórico, o PT e partidos
populares com inserção que trouxe a milhões de brasileiros. Esta classe se
mostra agora feliz com a possibilidade de atuar sem máscara e mostrando suas
intenções antes ocultas: finalmente temos chance de voltar e de colocar esse
povo todo que reclama reformas, no lugar que sempre lhe competiu historicamente:
na periferia, na ignorância e no silenciamento. Aí não incomodam nem criam caos
na ordem que por séculos construimos mas que, se bem olhrmos, é ordem na
desordem ético-social.
Esta
pretensão se liga a algo anterior e que fez história. É sabido que com a
vitória do capitalismo sobre o socialismo estatal do Leste europeu em 1989, o Presidente Reagan
e a primeira ministra Tatcher inauguraram uma campanha mundial de
desmoralização do Estado tido como ineficiente e da política como empecilho aos
negócios das grandes corporações globalizadas e à lógica da acumulação
capitalista. Com isso visava-se chegar ao Estado mínimo, debilitar a sociedade
civil e abrir amplo espaço às privatizações e ao domínio do mercado, até
conseguir a passagem de uma sociedade com mercado para uma sociedade de puro
mercado no qual tudo, mas tudo mesmo, da religião ao sexo, vira mercadoria. E
conseguiram. O Brasil sob a hegemonia do PSDB se alinhou ao que se achava o
marco mais moderno e eficaz da política mundial. Protagonizou vasta privatização
de bens públicos que foram maléficos ao interesse geral.
Que isso foi
uma desgraça mundial se comprova pelo fosso abissal que se estabeleceu entre os
poucos que dominam os capitais e as finanças e a grandes maiorias da
humanidade. Sacrifica-se um povo inteiro como a Grécia, sem qualquer
consideração, no altar do mercado e da voracidade dos bancos.
A crise
econômico-financeira de 2008 instaurada no coração dos países centrais que
inventaram esta perversidade social, foi consequência deste tipo de opção
política. Foram os Estados que tanto combateram que os salvaram da completa
falência, produzidas por suas medidas montadas sobre a mentira e a ganância
(greed is good), como não se cansa de acusar o prêmio Nobel de economia Paul
Krugman. Para ele, estes corifeus das finanças especulativas deveriam estar
todos na cadeia como criminosos. Mas continuam aí faceiros e rindo.
Então, se
devemos criticar a nossa classe política
por ser corrupta e o Estado por ser ainda, em grande parte, refém da
macro-economia neoliberal, devemos fazê-lo com critério e senso de medida. Caso
contrário levamos água ao moinho da direita. Esta se aproveita desta crítica,
não para melhor a sociedade em benefício do povo que grita na rua, mas para
resgastar seu antigo poder político especialmente, aquele ligado ao poder de
Estado a partir do qual garantiam seu enriquecimento fácil. Especialmente a
mídia privada e familiar, cujos nomes não precisam ser citados, está empenhada
fevorosamente neste empreitada de volta ao
velho status quo.
Por isso, as
massas deve continuar na rua contra elas. Precisam estar atentas a esta
infiltração que visa mudar o rumo das manifestações. Elas invocam a segurança
pública e a ordem a ser estabelecida. Quem sabe, até sonham com a volta do
braço armado para limpar as ruas.
Dai,
repetimos, cabe reforçar o governo de Dilma, cobrar-lhe, sim, reformas políticas profundas, evitar a
histórica conciliação entre as forças em tensão e o oposição para juntas
novamente esvaziar o clamor das ruas e manterem um status quo que prolonga benefíciois compartilhados.
Inteligentemente
sugeriu o analista politico Jeferson Miolo em Carta Maior (07/7/2013):”Há uma
grave urgência política no ar. A disputa real que se trava nesse momento é pelo
destino da sétima economia mundial e pelo direcionamento de suas fantásticas
riquezas para a orgia financeira neoliberal. Os atores da direita estão bem
posicionados institucionalmente e politicamente…A possibilidade de reversão das
tendências está nas ruas, se soubermos canalizar sua enorme energia
mobilizadora. Por que não instalar em todas as cidades do país aulas públicas,
espaços de deliberação pública e de participação direta para construir com o
povo propostas sobre a realidade nacional, o plebiscito, o sistema político, a
taxação das grandes fortunas e do capital, a progressividade tributária, a
pluralidade dos meios de comunicação, aborto, união homoafetiva,
sustentabilidade social, ambiental e cultural, reforma urbana, reforma
republicana do Estado e tantas outras demandas históricas do povo brasileiro,
para assim apoiar e influir nas políticas do governo Dilma”?
Desta forma
se enfrentarão as articulações da direita e se poderá com mais força reclamar
reformas políticas de base que vão na direção de atender a infra-estrutura reclamada
pelo povo nas ruas: melhor educação, melhores hospitais públicos, melhor
transporte coletivo e menos violência na cidade e no campo.
* Leonardo
Boff não é filiado ao PT, é teólogo e escritor, da Comissão da Carta da Terra
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